26 outubro 2009

O Corinthians e seu povo


Nenhuma palavra será dita sobre outra apresentação vexatória em casa, a terceira derrota no Pacaembu em quatro jogos. Contando o empate diante do Botafogo, são onze pontos perdidos - um a menos que a diferença entre nós e o líder do campeonato - que nos colocariam na briga pelo caneco. Isso, obviamente, se os vagabundos tivessem feito apenas e tão somente a obrigação em campo. Mas repito, não vou falar nada sobre o jogo.

Cheguei meio cedo ao Templo Sagrado no último domingo e resolvi aguardar o Janeiro na Praça Charles Miller, aproveitando para observar o ambiente antes da partida. Fiquei ali pelo jardim redondo, logo na entrada do Portão Principal, tomando algumas cervejas. Assim que me abundei no banco de concreto, a primeira cena curiosa. Ao meu lado, uma família de caipiras bastante alterados. Eis que chega o patriarca, torto de bêbado e feliz por ter dado uma entrevista para a globo. Ignorem o fato dele usar aquela bosta de camisa roxa que em nada representa o Corinthians, porque o cabra, além de tudo, foi um tremendo boa-praça.

O tiozinho logo sacou uma senhora que estava no mesmo banco que a gente. Corcoviando, ele escorreu para o lado da "moça" e ofereceu uma lata de Brahma - detalhe: todos os outros bebiam a intragável Itaipava no latão, por ser mais barata. Papo vai, papo vem, o véio contou a história da falecida esposa e a "moça" desabafou sobre a perda do ex-marido (ela havia se separado, mas estava triste com a morte do traste, vai entender). Em cinco minutos, o Seo João, como era chamado pelos netos, conseguiu o telefone da dita cuja e, pasmem, marcou um tititi posterior. Um dos moleques não se conteve: "quando eu tiver sua idade, quero ser igual a você!" E todos gargalharam.

O mesmo Seo João, depois de ensinar os herdeiros como galantear uma dama, puxou papo comigo contando suas lembranças do título do IV Centenário. "Garoto, eram 60 mil pessoas aqui, sem o Tobogã! Luizinho, Baltazar, Cláudio... Ô timaço! E aí a gente vê esses pernas-de-pau de hoje e fica triste". Aproveitei que ele citou o Pequeno Polegar e perguntei da história dele ter sentado na bola. "Não só sentou como humilhou o zagueiro. Coisa de louco era ver ele jogando, um mirradinho desse tamanho deitando e rolando".

Quando o papo começava a me interessar, os netos do Seo João o tiraram dali porque queriam entrar e, provavelmente, ver o Gordo. Só que não demorou nem cinco minutos e fui abordado por um baita de um criolo, falador à beça, e que vestia uma surrada camisa do Timão. Sem cerimônias, ele veio com aquela boca cheia de dente: "Caralho, e eu nem sabia que tinha corinthiano japonês!" Respondi que já era terceira geração e ele se emocionou: "Tá brincando? Tira aí uma foto comigo, que lá em Santa Rita do Sapucaí" - tinha mineiro a rodo -"ninguém vai acreditar nisso". Foto tirada, o cara ainda agradece: "Porra, e falam que japonês não gosta de preto! O Corinthians mistura tudo mesmo".

Vendo aquele mundaréu de gente, percebi que histórias como essas devem se repetir à exaustão nos momentos pré-jogo. Como disse sabiamente o negrão, a entidade Corinthians é capaz de eliminar qualquer diferenciação ao levar a seu povo a força necessária para acordar cedo na segunda-feira e ir trabalhar, mesmo depois de uma triste derrota. De um jeito ou de outro, as energias se renovam a cada ida ao Pacaembu - por isso o Templo Sagrado. Comove demais a característica inclusiva do futebol (ainda que muitos queiram acabar com ela), ao mesmo tempo que preocupa o fato de serem poucos os jogadores que saibam o significado de entrar em campo vestindo a camisa corinthiana.

6 comentários:

Bruno Ferraz (sOUL) disse...

Agora eu pergunto, com a iminente crise de modernidade que assola o futebol, você acha que histórias como essas continuaram a se repetir? Eles querem fazer do futebol algo sofisticado como se fosse golf, ora.. se foder esses caras.

Hoje eu to revoltado, velho!

Abraço Japonês!

Mônikita disse...

Belo texto Claudio...

Aliás é isso msm as idas no Pacaembu para ver o CORINTHIANS é mistico e as energias se renovam.
E eu e meu irmão sempre falamos uma coisa que é a pura verdade: ter se criado no chão da arquibancada desde pequeno e convivendo com o mais variado tipos de pessoas é uma vivência ímpar e faz de todos que têm essa oportunidade um ser humano mais completo.

Ahhh e eu vi a hora que o Sr. entrou, com sua camisa listrada e bermuda cor caqui ...rsrs
Vc passou embaixo do alambrado eu já estava na bancada não te chamei pq não ía dar pra me ouvir

Agora aquele bando de chinelinho tinha que saber disso né?

É NÓIS VAI CORINTHIANS!

Filipe disse...

Que crônica, Japonês!

Aliás, japonês que não é Corinthiano não merece nenhum crédito. Se for bambi, então, que cometa harakiri pra expurgar a merda.

Piorei, hoje nem fui trampar, tô malzão. Mas é nóis. Linkarei este post, naturalmente. É coisa que todo Corinthiano tem que ler.

"O CORINTHIANS MISTURA TUDO"

VIVA O CORINTHIANS!!!

evao do caminhao disse...

certeza q esta história termina com ele dando um cuecão nela

Thiago disse...

e o avaí e o começo de campeonato mais modorrento.

sinto falta desses papos de estádio.

Rodrigo Barneschi disse...

Viva a Brahma, japonês!

Ou como diria um ícone do lado de vocês: "Agradeço à Antarctica pelas Brahmas que nos mandaram".

Era um visionário!