21 agosto 2009
Estávamos todos no Bixiga
Nivaldo Santana, grande comunista e hoje vice-presidente da CTB, anunciou no último domingo o fim definitivo do Villagio Café. A casa já havia sofrido um revés importante, quando se mudou do tradicional endereço da Praça Don Orione para uma sobreloja sem alma na Teodoro Sampaio. A partir de agora, ficam só as lembranças, como a que vem a seguir.
Antes de tudo, abro parênteses para falar sobre o Nivaldo. Em nossos encontros esporádicos, o boa-praça abre seu característico sorriso meio tímido e solta a hiperbólica frase "esse é o japonês mais sambista do planeta", elogio imerecido que me faz corar por vir de quem vem. Conheci o Nivaldo nas atividades do partido e foi o então legislador quem assinou minha ficha de filiação ao PCdoB. Passamos grandes domingos na quadra do Peruche e na barraca da Maria, batemos muitos papos alvinegros no meio da muvuca do Samba da Graça na Roosevelt e tomamos muita cerveja no samba do Espaço CUCA, lá na Barra Funda.
O Nivaldo entra na história porque me foi apresentado por ninguém menos que a personalidade jurídica FH Borgonovi, o principal elo entre mim e o Bixiga, a Bela Vista, o PCdoB, os butiquins e o samba, assim como o é, em menor escala, o ex-deputado. E também foi o FH quem me levou ao agora falecido Villagio Café pela primeira vez, numa fria sexta-feira do ano 2000. Deixávamos a faculdade quando o representante máximo do Jaçanã fez a irrecusável proposta: "bora ver o Luiz Carlos da Vila?" Impossível dizer não...
Ao chegarmos, se aqueciam para as atividades Júlio Vellozo e Vandré "Jacaré" Fernandes. Solidários, viramos algumas ampolas no restaurante ao lado enquanto batíamos um papo sobre amenidades, já que à época ainda não mandava FH e Vandré à merda com tanta naturalidade como hoje (ninguém é irresponsável, imbecil e irracional o suficiente para mandar o Júlio à merda). Deu meia-noite no relógio e o momento era propício para adentrarmos ao templo que abrigou tantos nomes importantes da música e da madrugada paulistana.
Notem que não faz nem dez anos e era possível e natural chegar num buteco à meia-noite. A atração da ocasião, ressalte-se, só daria as caras no Villagio às duas da manhã - quem sabe uma estratégia dos donos do bar para deixar os clientes no mesmo nível etílico que Luiz Carlos. Fato é que tivemos uma noite inesquecível, com o "da Vila" mandando muito bem e fazendo gente chorar durante a apresentação.
Mês passado, voltei à rua 13 de Maio para encontrar o FH. Parei o carro na Don Orione, bem de frente ao local onde brilhava aquela luz baixa e amarelada sobre o par de mesas na calçada, um convite irresistível às almas perdidas em busca de salvação. Porém, já não havia mais luz, já não havia mais mesa, nem Nivaldo, Júlio, Vandré e Luiz Carlos da Vila (que perda!). Com exceção do FH, que trabalha a poucos metros dali porque insiste em se manter jovem socialista, não se encontra sequer um resquício das tantas histórias do Villagio. Nem parece que, há quase uma década, estávamos todos ali e o Bixiga vivia.
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3 comentários:
Claudio, adorei seu texto sobre o Villagio, muito cheio de alma. E as lembranças que ele vai deixar são grandes. As minhas primeiras são um tanto mais antigas que as tuas, nem por isso mais ternas. Temos que beber pelo fim do Villagio e na mesa de bar - como tem que ser - trocar essas lembranças. bjs
Puta texto bonito, japonês. E muito oportuno, posto que a falência da paulicéia para as coisas importantes da vida apenas se avoluma.
Nessa época, registre-se, comer pernil na porta do estádio (sim, a barraca da Dona Maria fazia todos jogos do Verdão) era tão obrigatório quanto hoje é proibido, infelizmente, comer ovo mal passado (por baitolagem do Kassab).
Enfim, grandes épocas, grandes amigos - e a estes rendo homenagens, pois é o que ainda resta a se comemorar nesta cidade.
Um abraço,
FH
Foda, mano...
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