08 junho 2009
Modernidade esfarelada
A recente notícia sobre as dívidas astronômicas de TODOS os clubes da Premier League passou batida pelos principais formadores de opinião no futebol. Porém, aqui na independência, na pirataria ou no lado esquizofrênico da rede blogueira, como queiram, a gente não vai virar o disco porque estamos vislumbrando o assassinato daquilo que nos move. O Seo Cruz, por exemplo, publicou os dados no sábado e, frente a tantos números vermelhos contrapostos à idéia de que na Europa tudo é lindo e cheiroso, logo de cara remeto o leitor ao post do Barneschi sobre a reportagem "O esporte que vendeu a sua alma" (para cadastrados no site).
A realidade começa a esfarelar aquela máxima de que o futebol deve seguir os preceitos da modernidade e as tendências de mercado para funcionar. Ao olharmos a lista dos devedores, notamos que quanto maior o investimento e profissionalismo, maior é sua a dívida. Apelando para uma lógica barata e que é regra nos jornalões e em alguns blogues de credibilidade, só com isso já poderíamos concluir que modelo administrativo, nesses termos, leva à falência.
Mas não vamos ficar no raso e façamos uma analogia do cenário decadente do esporte bretão à recente e devastadora crise do capitalismo. Da mesma forma que a mídia ignorou os verdadeiros motivos da quebradeira geral - a imoralidade da especulação financeira, vale lembrar - a fim de não contradizer décadas do blábláblá liberalista, os jornalistas esportivos têm grande dificuldade em assumir que o paixão do torcedor é, de fato, o elemento essencial. E aí resta a pergunta: se os resultados são conhecidos, seria responsável continuar nessa toada dentro e fora dos gramados?
De qualquer forma, as dívidas do campeonato mais rico do mundo expõem ao apedrejamento público as jogadas de marketing de tiro curto, a valorização de público-alvo cuja fidelidade é ínfima e as negociatas em benefício de terceiros, além de colocarem em xeque um modelo administrativo disseminado mundo afora como paradigma incontestável (parece alguém aqui do Brasil?). Novamente, é possível alinhar as crises: quando o calo apertou e a merda estava feita, empresas correram ao Estado; quando o bicho pegar, os cartolas irão buscar ajuda naqueles que foram expulsos dos estádios pelas medidas elitistas dos... cartolas!
Voltando ao texto do Seo Cruz, ele alerta que grande maioria das fontes financiadoras da Premier League são empresas com registros em paraísos fiscais. Eu vou além, e lembro que a Inglaterra se especializou em lavar dinheiro e dar asilo político à máfia russa. Imoralidades que ficam à margem de toda e qualquer análise de exaltação ao moderno e lucrativo futebol inglês, cujo único problema, segundo "especialistas", é a insistência dos hooligans (ah, esses marginais...) em comparecer aos estádios.
Na hora da bonança, o torcedor de arquibancada e as organizadas são bandidos, marginais e pobretões que reclamam de ingresso a preços altos e, por isso, deveriam ficar de fora do "espetáculo". Na hora da bonança, o Estado é um vírus ao capitalismo auto-suficiente, um monstro ultrapassado, e deve ficar de fora das decisões. A hora da bonança é a modernidade, mas assim como chega, ela vai embora. Cabe a nós evitá-la ou recolher os cacos.
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2 comentários:
Perfeitamente, meu caro.
Texto para referências futuras.
Abraço
Porra, japonês, sensacional! Texto definitivo mesmo, daqueles que merecem um link fixo. Vou criar isso no blog e deixar tudo por lá como um repositório de informações contra essa corja de visionários do futebol-empresa.
Abraços
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