Acontece, família corinthiana, que a história vem se repetindo desde 2006, ano da última vitória do Corinthians sobre o rival. Foi naquela noite fria de meio da semana que, guerreiramente, Marcelo Mattos meteu um golaço de cabeça para a festa na favela. A partir de então, nosso time passou a não entrar em campo diante da porcada e nunca mais fizemos uma apresentação digna deste duelo.
Se em 2007 e 2008 tínhamos limitações técnicas, nas últimas duas partidas a explicação é outra. Tirando o derby da cidade a que ele pertence, tira-se também o envolvimento que tal peleja requer. Ir até o Mato Grosso do Sul piora ainda mais as coisas, porque aquele fim de mundo é uma vergonha inenarrável. O que esperar de um bando de caipira que fica gritando "uhú" a cada lance, que xinga juiz de "lazarento" e "morfético" e que não tem o menor compromisso, pois sorri de uma desgraça e abandona o estádio antes dos 90 minutos?
O Corinthians perdeu para os verdes porque não jogou nada e eles jogaram tudo, de novo. Erros de escalação, possíveis cagadas de arbitragem (não vi e não vou ver nenhum lance pela TV) e qualquer outra justificativa é mera desculpa de um grupo de atletas que, parece, não entendeu a importância dessa partida. E provavelmente não entendeu porque não permaneu na cidade onde ela deveria acontecer. A corja imunda acertou em cheio na tentativa de desvalorizar o torcedor, dissolvendo e modernizando o Corinthians x palmeiras. Este blogue chapa-branca parabeniza toda a diretoria pela infeliz decisão de abrir mão do fator Pacaembu contra o maior rival por alguns trocados.
Bons tempos em que o clássico era um acontecimento gigantesco nesta capital paulista. Diante dessa lamentável derrota em que só um time se deu conta do que estava sendo disputado, vale reproduzir o conto "Corinthians (2) vs. Palestra (1)", do genial Alcântara Machado, a fim de alentar os corações alvinegros bastante machucados nesta segunda-feira. Mais tarde volto aqui para disponibilizar selos de protesto contra aquele lixo de lugar. Pro inferno com Presidente Prudente!
" Prrrrii!
- Aí, Heitor!
A bola foi parar na extrema esquerda. Melle desembestou com ela.
A arquibancada pôs-se em pé. Conteve a respiração. Suspirou:
- Aaaah!
Miquelina cravava as unhas no braço gordo da Iolanda. Em torno do trapézio verde a ânsia de vinte mi1 pessoas. De olhos ávidos. De nervos elétricos. De preto. De branco. De azul. De vermelho.
Delírio futebolístico no Parque Antártica.
Camisas verdes e calções negros corriam, pulavam, chocavam-se, embaralhavam-se, caíam, contorcionavam-se, esfalfavam-se, brigavam. Por causa da bola de couro amarelo que não parava, que não parava um minuto, um segundo. Não parava.
- Neco! Neco!
Parecia um louco. Driblou. Escorregou. Driblou. Correu. Parou. Chutou.
- Gooool! Gooool!
Miquelina ficou abobada com o olhar parado. Arquejando. Achando aquilo um desaforo, um absurdo.
Aleguá-guá-guá! Aleguá-guá-guá! Hurra! Hurra! Corinthians!
Palhetas subiram no ar. Com os gritos. Entusiasmos rugiam. Pulavam. Dançavam. E as mãos batendo nas bocas:
- Go-o-o-o-o-o-ol!
Miquelina fechou os olhos de ódio.
- Corinthians! Corinthians!
Tapou os ouvidos.
- Já me estou deixando ficar com raiva!
A exaltação decresceu como um trovão.
- O Rocco é que está garantindo o Palestra. Aí, Rocco! Quebra eles sem dó!
A Iolanda achou graça. Deu risada.
- Você está ficando maluca, Miquelina. Puxa! Que bruta paixão!
Era mesmo. Gostava do Rocco, pronto. Deu o fora no Biagio (o jovem e esperançoso esportista Biagio Panaiocchi, diligente auxiliar da firma desta praça G. Gasparoni & Filhos e denodado meia-direita do S. C. Corinthians Paulista, campeão do Centenário) só por causa dele.
- Juiz ladrão, indecente! Larga o apito. gatuno!
Na Sociedade Beneficente e Recreativa do Bexiga toda a gente sabia de sua história com o Biagio. Só porque ele era freqüentador dos bailes dominicais da Sociedade não pôs mais os pés lá. E passou a torcer para O Palestra. E começou a namorar o Rocco.
- O Palestra não dá pro pulo!
- Fecha essa latrina, seu burro!
Miquelina ergueu-se na ponta dos pés. Ergueu os braços. Ergueu a voz:
- Centra, Matias! Centra, Matias!
Matias centrou. A assistência silenciou. Imparato emendou. A assistência berrou.
- Palestra! Palestra! Aleguá-guá! Palestra Aleguá! Aleguá!
O italianinho sem dentes com um soco furou a palheta Ramenzoni de contentamento. Miquelina nem podia falar. E o menino de ligas saiu de seu lugar. todo ofegante, todo vermelho, todo triunfante, e foi dizer para os primos corinthianos na última fileira da arquibancada:
- Conheceram, seus canjas?
O campo ficou vazio.
- Ó... lh'a gasosa!
Moças comiam amendoim torrado sentadas nas capotas dos automóveis. A sombra avançava no gramado maltratado. Mulatas de vestidos azuis ganham beliscões. E riam. Torcedores discutiam com gestos.
- Ó... lh'a gasosa!
Um aeroplano passeou sobre o campo.
Miquelina mandou pelo irmão um recado ao Rocco.
- Diga pra ele quebrar o Biagio que é o perigo do Corinthians.
Filipino mergulhou na multidão.
Palmas saudaram os jogadores de cabelos molhados.
Prrrrii!
- O Rocco disse pra você ficar sossegada.
Amilcar deu uma cabeçada. A bola foi bater em Tedesco que saiu correndo com ela. E a linha toda avançou.
- Costura, macacada
Mas o juiz marcou um impedimento.
- Vendido! Bandido! Assassino!
Turumbamba na arquibancada. O refle do sargento subiu a escada.
- Não pode! Põe pra fora! Não pode!
Turumbamba na geral. A cavalaria movimentou-se.
Miquelina teve medo. O sargento prendeu o palestrino. Miquelina protestou baixinho:
- Nem torcer a gente pode mais! Nunca vi!
- Quantos minutos ainda?
- Oito.
Biagio alcançou a bola. Aí, Biagio! Foi levando, foi levando. Assim, Biagio! Driblou um. Isso! Fugiu de outro. Isso! Avançava para a vitória. Salame nele, Biagio! Arremeteu. Chute agora! Parou. Disparou. Parou. Aí! Reparou. Hesitou. Biagio Biagio! Calculou. Agora! Preparou-se. Olha o Rocco! É agora. Aí! Olha o Rocco! Caiu.
- CA-VA-LO!
Prrrrii!
- Pênalti!
Miquelina pôs a mão no coração. Depois fechou os olhos. Depois perguntou:
- Quem é que vai bater, Iolanda?
- O Biagio mesmo.
- Desgraçado.
O medo fez silêncio.
Prrrrii!
Pan!
- Go-o-o-o-ol! Corinthians!
- Quantos minutos ainda?
Pri-pri-pri!
- Acabou, Nossa Senhora!
Acabou.
As árvores da geral derrubaram gente.
- Abr'a porteira! Rá! Fech'a porteira! Prá!
O entusiasmo invadiu o campo e levantou o Biagio nos braços.
- Solt'o rojão! Fiu! Rebent'a bomba! Pum! CORINTHIANS!
O ruído dos automóveis festejava a vitória. O campo foi-se esvaziando como um tanque. Miquelina murchou dentro de sua tristeza.
- Que é - que é? É jacaré? Não é!
Miquelina nem sentia os empurrões.
- Que é - que é? É tubarão? Não é!
Miquelina não sentia nada.
- Então que é? CORINTHIANS!
Miquelina não vivia.
Na Avenida Água Branca os bondes formando cordão esperavam campainhando o zé-pereira.
- Aqui, Miquelina.
Os três espremeram-se no banco onde já havia três. E gente no estribo. E gente na coberta. E gente nas plataformas. E gente do lado da entrevia.
A alegria dos vitoriosos demandou a cidade. Berrando, assobiando e cantando. O mulato com a mão no guindaste é quem puxava a ladainha:
- O Palestra levou na testa!
E o pessoal entoava:
- Ora pro nobis!
Ao lado de Miquelina o gordo de lenço no pescoço desabafou:
- Tudo culpa daquela besta do Rocco!
Ouviu, não é Miquelina? Você ouviu?
- Não liga pra esses trouxas, Miquelina.
Como não liga?
- O Palestra levou na testa!
Cretinos.
- Ora pro nobis!
Só a tiro.
- Diga uma cousa, Iolanda. Você vai hoje na Sociedade?
- Vou com o meu irmão.
- Então passa por casa que eu também vou.
- Não!
- Que bruta admiração! Por que não?
- E o Biagio?
- Não é de sua conta.
Os pingentes mexiam com as moças de braço dado nas calçadas."
4 comentários:
Se não "entramos" em campo como você bem colocou , se fomos inertes contra o arqui-inimigo , se os jogadores estão pensando em suas vendas , QUEM POR OBRIGAÇÃO DEVERIA PESAR NO PSICOLÓGICO DELES E FAZE-LOS "BABAR" EM CAMPO ?
Quem por obrigação deveria colocar o time pra frente e jogando ofensivamente como manda o manual ?
Quem deveria fazer substituições no mínimo dignas para não desmantelar ainda mais o esquema tático ?
QUEM ? QUEM ?
Guilherme, o problema maior, infelizmente, é outro. E a bunda-molice do técnico é só reflexo dele...
Claudio,
mataste a charada!!! Nem tanto por ser no interior mas que este classico merece uma preparação diferenciada!!!
Hoje tá dificil. Valeu por resgatar esta crônica.
Abraços.
Feliz timão 2009
VAI CORINTHIANS!!!
Postar um comentário